Profissionais, lideranças e estudantes lotaram o
auditório do Museu Nacional de Brasília-DF
O problema das drogas se
resolve com a oferta de alternativas e não com a criminalização dos usuários. A
receita veio dos Estados Unidos através do discurso do pesquisador da
Universidade de Columbia, Carl Hart, na palestra principal do I Congresso Internacional
de Prevenção dos Problemas Relacionados ao Uso de Drogas – Previne 2014. Hart é
autor do livro: “Um preço muito alto”, no qual ele relata suas experiências de
jovem negro de um gueto de Miami que se tornou um professor de neurociências da
Columbia.
Para Hart, a relação entre
drogas, pobreza e violência não tem fundamento, já que se retirar a droga da
referida equação continuarão a existir a pobreza e a violência. O pesquisador
entusiasmou parte do público de formadores de opinião que participou do Previne
2014, realizado de 27 a 28, no auditório do Museu Nacional de Brasília. O
evento foi promovido pela SENAD, do Ministério da Justiça, Ministério da Saúde
e Universidade Federal de Santa Catarina.
Hart atribui o pânico que
existe na sociedade, com relação ao uso de drogas, à inadequação dos métodos de
pesquisas utilizando animais. Nas pesquisas que realizou com jovens usuários de
drogas os resultados foram diferentes porque ele oferecia outras alternativas
mais valorizadas que a droga, ou seja, dinheiro. “Os jovens preferem receber
dinheiro a usar drogas”, garante o pesquisador.
Para enfatizar que o uso de
drogas não é determinante para que se tenha problemas na sociedade, o
pesquisador citou os exemplos dos presidentes dos Estados Unidos: Bill Clinton,
W. Bush e Obama, que fizeram uso de drogas na juventude e mesmo assim foram bem
sucedidos na vida.
Segundo Hart, nos Estados
Unidos, 80% das prisões efetuadas pelo uso de crack são de pessoas negras, o
que se caracteriza como um problema de discriminação racial. “Os negros são
quatro vezes mais propensos de serem presos do que os brancos”, afirmou o
pesquisador.
O pesquisador é um defensor
da descriminalização do uso de drogas e de um forte investimento em
alternativas para a juventude, a exemplo de emprego, boa alimentação e
educação. No entanto, Hart reconhece que existe uma minoria na sociedade que
tem problemas com o uso de drogas, que ele considera irrelevante para ter
políticas específicas.
Sobre a maconha, o
pesquisador afirmou que quatro Estados americanos já liberaram o produto para
uso recreacional e 23 para uso medicinal. O mito de que o uso da maconha causa
perturbação ou enlouque os usuários foi criado pela publicidade americana,
assinalou Hart.
O público que participou
atentamente da palestra do cientista americano ficou dividido entre a cruz e a
espada: alguns chegaram a alegar experiências de dependência pessoal pelo uso
de drogas, enquanto outros concordaram plenamente com a preleção do professor
Carl Hart.
PREVENÇÃO
A programação cultural do
evento teve início com a palestra sobre o tabagismo realizada pela doutora Vera
Lucia da Costa e Silva, chefe do secretariado da convenção-quadros para o
controle do tabaco da OMS. Segundo ela, na nossa cultura “ser homem é uma
condição sistêmica para o uso de drogas”.
Á direita da foto
Apesar das mudanças
culturais sobre o uso do tabaco que há 30 anos era um companheiro indispensável
do cafezinho, que faz parte da nossa cultura alimentícia, ainda existe 1,3
bilhão de fumantes no mundo, sendo 80% em países em desenvolvimento. Segundo
ela, são seis milhões de morte por ano e 100 mil adolescentes se tornando
dependentes do cigarro por dia, principalmente, em países em desenvolvimento.
O evento foi rico em
experiências na área da prevenção ao uso de substâncias, sendo que
a maioria
dos trabalhos apresentados tinham sido realizados com a utilização das ferramentas do Elos, Tamojunto e Fortalecento Famílias; metodologias que foram introduzidas nas escolas através de projeto da Coordenação Nacional de Saúde
Mental, Álcool e outras Drogas, do Ministério da Saúde, no contexto das
políticas públicas sobre drogas.
Zila Van Der Meer Sanchez (USP)
O projeto de prevenção da Coordenação de Saúde Mental foi
bem dissecado na mesa sobre prevenção nas escolas, com a apresentação de
indicadores que buscam validar a metodologia.
Gregor Burkhart -
Observatório Europeu de Drogas
Uma mesa de destaque no
evento abordou o tema: Prevenção – da ciência à realidade brasileira, na qual o
pesquisador Gregor Bukhart, do Observatório Europeu de Drogas e
Toxicodependências, fez uma análise retrospectiva de todas as metodologias
conhecidas na área da prevenção, elencando os prós e contras. Ele criticou os métodos
racionalistas da prevenção, enfatizando que é mais adequado lidar com as
situações concretas que geram capacidade, oportunidade e motivação.
O professor Jessé Souza, autor do livro “A ralé brasileira - quem é e
como vive", afirmou que as drogas estão em todas as classes sociais. No
entanto, para o pesquisador, o uso desses produtos na classe média não destrói
as relações necessárias à reprodução da vida. Já o uso de drogas nas classes
proletárias, sem a oferta de outras alternativas, impede o desenvolvimento
pessoal.
A partir da esquerda: Roberto Tikanori (MS), Jessé Souza
(UFF) e Leon Garcia (SENAD)
O professor ilustrou sua
fala com o exemplo de que um indivíduo da classe média que estudou pouco,
sempre tem mais probabilidades de evoluir social e economicamente do que uma
pessoas pobre que estudou muito.
Fátima Sudbrack -
Redes de Prevenção
A professora Fátima
Sudbrack, da UnB, trouxe para o público do evento as experiências de vários
anos de academia lidando com os métodos de prevenção comunitária. Para ela, a
prevenção deve considerar as demandas locais no cruzamento dos saberes
coletivos.
A pesquisadora também
defendeu a dimensão participativa da prevenção e o enraizamento das
intervenções no tecido social, buscando as parcerias múltiplas e o
empoderamento das comunidades. Para Sudbrack, é importante mudar os paradigmas
da prevenção e das intervenções construindo novas representações no campo da
superação dos estigmas e dos preconceitos.
A partir da
esquerda: Denis Petuco, Nathália Oliveira, mediador, Sudbrack e o Padre Vilson
Groh
O trabalho do padre Vilson
Groh, do Projeto em Rede, desenvolvido com jovens em situação de
vulnerabilidades sociais em Florianópolis, foi um dos mais aplaudidos do
evento. Segundo o padre Vilson, não são os jovens que estão em conflito com a
lei, mas a lei está em conflito com os jovens. No seu trabalho, que afasta os
jovens das drogas e da criminalidade, ele “não olha o dano, mas o capital
social existente na comunidade”.
Muitas outras abordagens
desfilaram pelas mesas de debates do evento, demonstrando a criatividade e a
competência de acadêmicos e profissionais que atuam na área da prevenção ao uso
de drogas, a exemplo do trabalho de Nathália Oliveira, do Centro de Convivência
É de Lei; bem como a criatividade de Dênis Petuco, na interpretação das
campanhas de prevenção ao uso de drogas em um trabalho de mestrado. O
pesquisador revelou, no seu trabalho, que as campanhas de prevenção criam seres
intocáveis como os “zumbi” dos filmes de terror para estigmatizar os usuários
drogas.
Nara Santos,
Daniela Schneider e Ana Cecília
O evento foi uma excelente
oportunidade para os profissionais e os formadores de opinião, que atuam na
área das políticas sobre drogas, conhecerem as metodologias que estão em
desenvolvimento nas diversas regiões do País e, desta forma, poderem aderir aos
editais que serão abertas pela SENAD em 2015, com o objetivo de fomentar ações
de prevenção ao uso de drogas nas escolas e nas comunidades.
Crisvalter
Medeiros
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