quarta-feira, 8 de junho de 2011

A rapidez do narcotráfico e o marasmo da ciência



Crisvalter Medeiros

Os esforços envidados pelas professoras Vania Medeiros (IFPB) e Vania Gico (UFRN) para fazer avançar a formação profissional na área de drogas nos Estados da Paraíba e Rio Grande do Norte demostram o nível de responsabilidade que alguns acadêmicos deste País têm com a questão social e, por outro lado, desvela a irrelevância que essa temática representa para a área cientifica, principalmente no que se refere à política nacional de pós-graduação.

As duas professoras estão engalfinhadas numa luta de Davi x Golias para superar as barreiras para aprovação de um mestrado profissional na área de atenção e reinserção social de usuários de drogas. Isto representa uma das demandas mais urgentes na nossa região que está sendo castigada pela cimitarra do narcotráfico que ceifa as vidas dos nossos jovens e adolescentes (dos dois sexos) com a venda ilícita do crack.

De acordo com o mapa da violência de 2011, divulgado, recentemente, pelo Ministério da Justiça, as taxas de violência das regiões Norte/Nordeste aumentaram significativamente no período pesquisado entre de 1998 a 2008; os homicídios dobraram praticamente. Sabe-se, por outras fontes, que a maioria desses crimes está relacionada ao trafico de drogas que, em algumas áreas, tornou-se a única opção de vida (e morte) para a juventude.

Os números são gritantes: a taxa de homicídios (por 100 mil habitantes) em 1998 em Alagoas era 21,8, pulou para 60,3 em 2011, elevando o Estado para o primeiro lugar no ranking nacional. A Paraíba passou de 13,5 para 27,3, deixando o Estado na faixa do 15º colocado, e o Rio Grande do Norte, que tinha uma taxa de 8,5, subiu para 23,2, indo para o 19º lugar. No Pernambuco a taxa caiu, mas o Estado continua no topo, em 3º lugar, com 50,7. Essa é a nossa triste realidade.

Mas o que tem a ver esse caldo de cultura condimentado pelas drogas, violência e a ciência? Não precisa ser da alta costura para fazer esse alinhavo.

Segundo informações catadas no blog do doutor Roberto Lobo, da USP-SP, as Universidades Federais apresentam a média de 54,46% de doutores no Brasil, sendo que a região Norte tem 34,99% e a Nordeste 46,38%. Se computados mestres e doutores estes percentuais se elevam para 79% no Brasil, 70% no Norte e 72% no Nordeste contra 83% no Sudeste e 84% no Sul. Conforme a ciência estatística não somos tão pobres de cientistas. Mas, aí vem a pergunta que incomoda: Por que tanta violência e tantos problemas sociais numa realidade pululante de acadêmicos tão competentes? A resposta traumática é que a ciência não deve se preocupar com intervenções sociais, mas com a produção do conhecimento, ou seja, cientistas existem para pensar. E os demais o que fazem?

Voltando lá prá cima, para o início do texto, retomo o foco da luta das professoras Vania & Vania para a implantação de um mestrado profissional no Nordeste (Paraíba ou Rio Grande do Norte), na área de atenção e reinserção social de usuários de drogas.  Segundo a CAPES, órgão responsável pela burocracia da produção científica no País, há uma grande barreira a ser superada: a falta da idolatrada produção científica para dar sustentação ao tal mestrado, já que demandas sociais, que existem de sobra na região, não são argumentos suficientes que justifiquem ações educacionais quando o nível é pós-graduação.

Bom, aqui, nos caímos num velho paradoxo: quem vem primeiro, o ovo ou a galinha? A pesquisa científica na área de drogas no Brasil é muito recente. Um dos mais conhecidos centro de excelência nessa área, o CEBRID, da Unifesp, foi implantado em 1978; a UNIAD, também da Unifesp, é de 1994. O único setor de referência acadêmica na área de drogas no Nordeste é o CETAD da UFBA, que iniciou suas atividades em 1985. Outras iniciativas que alcancei em uma rápida pesquisa, não-científica, obviamente, são bem mais recentes; donde se conclui que temos por volta de três décadas de interesses acadêmicos sobre essa área, e de forma bastante concentrada.

Portanto, a CAPES exige produção acadêmica na implantação de um novo programa, sendo que esta produção só é viável quando se tem um programa. Eis a questão: quem virá primeiro para o Nordeste, o ovo ou a galinha.

Sem querer baixar o nível, vou inserir nesse discurso uma palavra bastante incômoda, narcotráfico; pois é, esse ramo do comércio, muito embora ainda instalado na nossa economia de forma ilegal, mas com gente importante querendo legalizá-lo, coincidentemente da própria academia, tem sido rápido e eficiente nas suas formas de atuação, utilizando-se de ferramentas tecnológicas e científicas para otimização dos seus produtos.

É quase inconcebível para um simples mortal entender que a ciência não se envolva com questões de demanda social. Sem querer, fico pensando: Para que serve a Universidade que é sustentada com o dinheirinho suado do povo brasileiro? Quais são os objetivos da política de pós-graduação nacional? Ousadamente me ocorre a ideia de que é apenas para sustentar uma burocracia corporativa das mais exigentes e sofisticadas que serve apenas aos seus próprios interesses, ou seja, a auto-reprodução da própria academia. Diga-se de passagem, em detrimento do restante da população.

Um comentário:

  1. Professora Vania Medeiros é uma desbravadora! eu sou sua fã. Lenina

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